“As
palavras da poesia não têm regras precisas, cânones definidos,
ortodoxias impostas; gosta-se, não se gosta. É tudo! Eu gosto do que o
autor escreve.
Paulo Alexandre e Castro revela essa heterodoxia, heresia
e desregramento sobre a morte neste livro que tem o horrível título Há
flores de plástico e gravilha a enterrar a memória. Mas é horrível
porque é preciso, porque nos dá a verdade que nenhum de nós quer
enfrentar. Temos medo, temos dor e em vez de como o autor refletir sobre
o medo, a dor da morte, fugimos de tudo isto na esperança vã de jamais
sermos apanhados. Mas um dia também teremos a nossa campa de mármore
branco, lavada a lixívia com alto grau de pureza, e quem sabe, com
flores de plástico e gravilha a enterrar a memória. No fundo, com esta
obra podemos ‘aprender’ a morrer, isto é, a valorizarmos a vida que nos
foi dada viver.”
Henrique Monteiro, Jornalista, Redactor Principal e ex-Director do jornal Expresso
"A poesia de Paulo Alexandre e Castro convive e flui entre a experiência pessoal do eu poético e a individualidade de cada leitor. O peso da vizinha morte atinge o insipiente quotidiano, conduzindo o homem por um caminho de sofrimento.
O autor estabelece um compromisso poético com o homem comum: não viver agrilhoado à banalidade da existência diária. A sua obra desafia pelas palavras a agarrar o tempo, que cada novo dia nos dá, na tentativa de uma conquista feliz de sabedoria interior."
Ana Lúcia Curado, Professora na Universidade do Minho
Eu não queria gostar deste livro
Como leitores, temos o direito de criar expectativas. E depois de termos centenas de leituras na nossa bagagem, tendemos a fazer um julgamento bastante antecipado dos livros que temos à frente. Tão antecipado que nos atrevemos a adivinhar se vamos gostar ou não antes de o começar a ler. Muitas vezes acertamos na nossa intuição (que não é mais do que a voz da experiência literária), e outras vezes somos surpreendidos (por essa magia, razão pela qual vale sempre a pena pegar no próximo livro).
Aborrecem-me aqueles autores poéticos tremendamente inspirados que se perdem em longos desabafos criativos, de expressões muito trabalhadas e palavras caras, ocas e sem sentido algum. Escrever bem não é usar palavras bonitas. Mais importante, publicar um livro é assumir o compromisso de dar o prazer da leitura às pessoas, mais do que mostrar ao mundo que consegue escrever muito bem. E com um título como Há flores de plástico e gravilha a enterrar a memória, longamente pomposo, imediatamente me enfastiei.
Mas Paulo Alexandre e Castro escreve genuinamente. Não há nenhum esforço exagerado na sua escrita, nenhuma pretensiosidade. Ele é mesmo assim, um escritor poético e emotivo. Um bom escritor.
É verdade que ou se gosta ou não se gosta. Em poesia, isso é uma verdade incontornável, digo eu. O texto poético não é uma experiência de leitura leviana. Por isso, certamente muitos leitores não vão achar piada a este trabalho. Apesar disso, afirmo que estes poemas nunca serão desprovidos de qualidade.
A morte é o grande mote destes poemas, desde a sua acepção mais metafísica à fria realidade da carne morta, das lápides brancas. Não é uma leitura aconselhada a quem tem o estômago fraco, não por ser fisicamente violento mas porque oferece pouca alegria. É um livro triste, deprimente, que não procura de todo aliviar o peso da morte. Muito pelo contrário, obriga-nos a enfrentar essa crueldade do destino. Ao longo dos 58 poemas, somos desafiados a viver o sofrimento que a morte traz e a aceitá-la. Passamos a ser meras gavetas num cemitério, ou o pretérito dessa realidade. Sentimos a "ausência de deus" perante a biologia da decomposição e as "campas de mármore branco", ouvimos as "pedras sobre a caixote envernizado de madeira", e intencionalmente somos parte dos versos. Somos a "estrofe de um poema não verbalizado" que um dia acabará.
Mas é belo, tão belo. Por muito intensas que sejam as imagens evocadas pelo poeta, há uma sensação de consciencialização nas suas reflexões, uma espécie de despertar para a realidade da vida. Talvez não seja inspirador, mas é estranhamente reconfortante porque não nos esconde nada. Quando somos crianças, a morte é um assunto tabu que os adultos não gostam de abordar (erradamente na verdade). Agora, Alexandre e Castro dá-nos a oportunidade de explorar ao máximo a matéria, não nos privando de qualquer reflexão possível. E nessa clarificação há uma espécie de aconchego, estranho mas real. Como se, como Ana Lúcia Curado afirma, conquistássemos uma espécie de sabedoria interior.
De vez em quando há alguns poemas que achei exagerados, sobretudo os mais raivosos e os mais explícitios. Paulo Alexandre e Castro tem muito, muito jeito para filosofar, mas não tanto para falar de vermes ou cadáveres. De qualquer forma, são poucos esses momentos forçados.
Já com o romance Loucura Azul fui surpreendido. Não aprendi a lição à primeira e Há flores de plástico e gravilha a enterrar a memória relembrou-me a não menosprezar as capacidades literárias de Paulo Alexandre e Castro. Vou tentar não voltar a desconfiar.
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