terça-feira, 19 de janeiro de 2010

A Guerra É Para os Velhos, de John Scalzi

No futuro todos teremos uma nova vida ao serviço das Forças de Defesa Colonial. Se sobrevivermos à Guerra...

O SEU NOVO EU

Uma introdução ao novo corpo, destinado aos recrutas das Forças de Defesa Colonial
Da Equipa de genética Colonial
Dois séculos a conceber corpos melhorados!

Esta era a página de abertura do panfleto que me aguardava no computador. Precisavam de ver a ilustração. Inspirada no famoso estudo de Da Vinci a propósito do corpo humano, apresentava um gajo verde, nu, no lugar do gajo original. Mas, adiante.

Gosto de ler Ficção-Científica. Não tanto quanto Fantasia, embora para muitos os dois não sejam tão diferentes quanto isso. De facto, são dois géneros que se tocam. A diferença é que a Fantasia chega-se um pouco mais perto do sonhador. A Ficção-Científica, embora ficção, tem o dever de desenvolver a sua teoria, a ciência que fá-lo parecer o mais verosímil possível. A Fantasia não tem de se preocupar tanto com a veracidade do seu mundo.

E portanto, sou muito, muito exigente no que toca a este tipo de livros. Por exemplo, adorei Contacto, de Carl Sagan, não só porque a história me cativou absolutamente, mas principalmente porque toda a ciência, todas as teorias, estão bastante bem explicadas e desenvolvidas ao pormenor. E numa linguagem bastante acessível.
A Guerra é para os Velhos não me chamaria a atenção imediatamente. De alguma maneira, o título não parece muito satisfatório, e a capa demasiado pesada. Mas não tem nada a ver com o "sumo" destas páginas.

Antes de mais, o título. A guerra é para os velhos! E porquê? Porque apenas os velhos têm maturidade e experiência de vida suficientes para pesarem a sua consciência, para saberem pelo que lutam.De alguma forma, apenas um velho pode ter a noção do que é a guerra, do que é o seu papel, e isso traz uma série de questões filosóficas e morais à baila. Este é, sem dúvida, uma das coisas mais interessantes do livro.
Embora num futuro distante, presumimos, há uma enorme consciência humana, e quando entramos finalmente nessa guerra espacial somos confrontados com uma série de comportamentos e atitudes de cada humano que os leva, às próprias personagens, a levantar várias questões de consciência global. Só um velho, com experiência de vida, seria capaz de pôr em causa uma guerra, e de ao mesmo tempo encontrar nela uma justificação plausível. No mínimo, um imberbe chegaria a apenas uma dessas duas conclusões. Daí que faça todo o sentido Scalzi criar esta ideia de velhos que vão para o campo (ou, melhor dizendo, espaço) de batalha. Ainda mais difícil é colocar estas questões quando estamos a lutar com espécies alienígenas, e não com a nossa própria espécie!!! Mas o autor não desiste desta sua premissa, e por isso mesmo vale a pena sermos confrontados com esta imagem do futuro, do Homem ou do próprio Universo.

Depois, temos a guerra espacial. As naves gigantescas, as armas super potentes, os extraterrestres das mais variadas formas, planetas longínquos, viagens que atravessam universos! Ficção-Científica pura, daquela a que nós estamos habituados.

Fez-me lembrar uma mistura de jogos de conquista espacial (como Galactic Civilizations, Sins of a Solar Empire, etc) com vários clichés do género. Aliás, é um universo relativamente simples que nos é apresentado, mas com imensas características (até uma espécie de mistura com o filme Avatar, agora tão na moda). O problema é que isto tudo não me pareceu suficientemente pormenorizado. Como disse, acho que devo ser exigente neste género. E, infelizmente, não são cientistas que escrevem estas obras, mas escritores. Daí que se compreenda que apenas um par de situações sejam descritas com algum pormenor, e neste caso a teoria de um "multi-universo". Uma fascinante lição de Física, mas que não desvaloriza a falta de pormenores noutras situações.

É uma história altamente cativante! Seguimos John Perry desde que ele deixa a Terra para se alistar nas Forças de Defesa Colonial, que defende sem parar as colónias humanas noutros planetas, quando John sofre a sua transformação para fazer parte desse exército épico e até que ele entre nos vários campos de batalha, onde a vida nunca foi tão dura. A escrita do autor é ainda menos cansativa do que estava à espera, aliás até tem bastante mais humor do que esperava!
Para além disso, nada nos faz esperar o que vamos encontrando ao longo do percurso de Perry. Não é propriamente previsível o que o futuro nos espera, pelo que se mantém uma certa carga de expectativa ao longo da leitura.

Ainda assim, preferia que o livro fosse mais detalhado. Todos estes cenários, todas estas personagens e todas estas questões morais, humanas, estão pouco pormenorizadas. Acho que o autor devia ter tido mais garra ao levantar este tema. Devia ser mais velho. Faltou a experiência de vida de um velho de 75 anos para escrever este livro. Embora tenha as melhores ideias, porventura um dos melhores enredos, foi um livro que no fim achei um pouco mais simples do que se pretendia. Quer-se que o autor arrisque, que vá mais longe, porque este livro merece ser discutido. E, para mim, essa foi a sua maior falta, e a razão pela qual este livro podia ter sido mais do que fenomenal.

Uma leitura que me deixou mais cativado do que esperava, e por isso recomendo a todos. Há que dar uma oportunidade a todos os géneros literários, e este é uma boa aposta. Embora a experiência de vida e maturidade humana que se espera destes velhos que vão para a guerra espacial tenha sido precisamente a maior falta do autor (creio que, se houvesse essa experiência, teria esmiuçado muito melhor desde questões humanas do livro a fenómenos tipicamente de FC)... Espero ansiosamente pelas sequelas, e pelo que ainda está para vir!

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