domingo, 14 de novembro de 2010

O Exorcista, de William Peter Blatty

Publicado pela primeira vez em 1971, O Exorcista tornou-se não só um fenómeno literário como um dos livros mais assustadores e controversos alguma vez escritos. A história centra-se em Regan, a filha de doze anos de Chris MacNeil, uma ocupada actriz que reside em Washington D.C. A criança aparenta estar possuída por um demónio ancestral e cabe a dois padres a dura tarefa de o exorcizar, arriscando a sanidade e a própria vida.  
O Exorcista transcendeu as páginas escritas e saltou para o grande ecrã, onde se tornou uma referência incontornável do cinema. Mas se pensa que o filme é assustador, leia o livro. Até porque o filme nem chega a aflorar a ponta do iceberg! Propositadamente crua e profana, O Exorcista é uma obra com a capacidade de nos chocar, levando-nos a esquecer que "é apenas uma história".

"Tão superior a muitas outras obras do mesmo género quanto uma equação de Einsten é superior a uma coluna de números feita por um contabilista."
The New York Times Book Review


Aqui está o livro que deu origem a um clássico do cinema.
Clássico??? É uma lenda!!! Em 1973, a toda a hora paramédicos eram chamados às salas de cinema porque pessoas desmaiavam ou entravam em histeria! Há quem tenha ficado atormentado durante anos por causa do filme. Nove pessoas relacionadas com o filme morreram durante as filmagens, incluindo um dos actores.
É considerado o melhor filme de terror de todos os tempos, e o mais assustador.


Não sabia que havia o livro. E data de 1971! É, portanto, com agrado que surge de novo (o livro foi publicado pela Europa-América, mas suponho que tenha ficado esquecido) a obra, no meio de tantas novidades tão recentes.


Não acredito que um leitor esteja à espera da qualidade que "O Exorcista" oferece. Não estamos à espera de ver, junto com uma história de terror, um enredo denso o suficiente e uma qualidade de escrita acima do normal! Como St. Louis Post-Dispatch disse, e essa foi a minha maior conclusão quanto ao livro, é preciso lê-lo duas vezes: primeiro para saborear a intensidade da história e o quão apavorante consegue ser, e segundo para saborear a qualidade de escrita.


Ao contrário do que se espera, para mim este livro lida muito mais com uma luta psicológica, e daí a sua complexidade. Trata-se de uma afronta às crenças da personagem. Não se trata da história do exorcismo ou da vítima do demónio: trata-se, como o título indica muito bem, da história do exorcista. Trata da falta de fé do exorcista, da sua descrença em Deus, de como o que decidiu da vida e de como abandonou a mãe lhe pesa nos ombros. Será este "exorcismo" o "sinal de Deus" que ele pediu?
E, no entanto, este livro contraria aquela típica frase "Se acreditas no Diabo tens de acreditar em Deus".


Enfim, surgem dezenas de questões durante a sua leitura. Assusta, é verdade. Logo a partir do início, há este ambiente de mistério e suspense que nos deixa a temer pelo que vem nas próximas páginas. Ninguém consegue chegar a uma conclusão em relação à estranha doença que atingiu Regan MacNeil. Que se passa? E é nesse impasse, nessa busca da verdade, que esperamos o momento em que o nosso coração vai explodir de susto...


No entanto, a partir de certa altura, quando o "demónio" ganha voz, acho que bastante do terror que sentimos desaparece. A verdade é que assusta mais o "inexplicável" do que a sua personificação, pelo que quando passamos a "falar" com o demónio o susto acalma bastante. O livro assume-se definitivamente para as restantes personagens: para as vítimas do demónio, sem que estas sejam possuídas.


O que é o demónio? A personificação da nossa culpa. E é-lo para todos no livro. O que nos "desilude" um bocado de fenómenos paranormais. O que nos lembra que isto é só um livro e que o seu verdadeiro objectivo é fazer-nos reflectir sobre o que realmente acreditamos e sobre a natureza humana, mais do que fazer-nos acreditar em demónios e espíritos.
E faz-nos pensar na morte. Talvez seja o tema mais forte do livro. A eterna questão: o que há depois da morte? O que é o vazio? O que é a existência?
Tira o sono a qualquer um de nós.


Muito bom. Não é caso para esperarem mijar de medo, embora seja bastante sugestivo. Tem a sua cinematografia, o que justifica absolutamente o filme. É sobretudo um livro com uma vertente psicológico bastante forte, que levanta com grande mestria questões de crença e fé. Isso sim faz dele o "grande livro" que todos elogiam.
Tudo escrito por um verdadeiro escritor: subtilezas na escrita, imagens bastante sugestivas, uma linguagem bastante fácil de acompanhar mas de grande qualidade literária.
Uma obra de grande valor, que tal como o filme justifica como é que uma história de terror consegue ser uma verdadeira obra-prima.



2 comentários:

Unknown disse...

"assusta mais o "inexplicável" do que a sua personificação"
Tens toda a razão, Pedro. Um dia, Sartre afirmou: "O Inferno são os outros". Acho que o grande mestre do existencialismo podia ter ido mais longe: o Inferno são os outros, quando nós, com os nossos demónios nos confrontamos com eles.
O inexplicável aterroriza-nos. O inexplicável é um dos nossos maiores demónios.
Este livro deu um magnífico filme; aliás é o único filme de terror que me aterrorizou de facto. Foi o único que não me fez rir. Mas mesmo nada.
Perante isto é muito difícil que o livro me agrade mais que o filme. Mas hei-de tentar.
Por comparação, veio-me agora à memória o Frankenstein. O livro é mil vezes melhor, mais rico e eficaz que qualquer filme; é mais uma razão para eu tentar ler o Exorcista.

Pedro disse...

Jimmy (e tantos outros autores),
agradeço que, no seu caso, envie essa divulgação para o meu email. Acho muito bem fazer uma pequena referência ao seu livro aqui, mas nesse caso comente também em relação ao que escrevo.

Manuel Cardoso,
sim, tenta! Não tenho a certeza se este livro é mais rico do que o filme, aliás o argumento foi escrito pelo próprio autor portanto as diferenças são poucas! Talvez o filme seja mais assustador, como disse este concentra-se bastante nos dilemas do próprio exorcista... Frankenstein é, de longe, bem mais rico do que o filme. Bem mais rico do que muitos livros. Um dos livros mais ricos, pronto!
É uma curiosidade, então, leres este livro. Não darás o teu tempo por perdido, garanto, para além da história que já conheces a escrita de Blatty é de uma qualidade inegável.

Gizmah,
obrigado pela sugestão! A próxima crítica será enviada =)

Boas leituras!

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